quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

ENTREVISTA COM RÔMULO RÁS


Tive a honra de entrevistar o artista monlevadense Rômulo Rás. Rômulo é um artista verdadeiro, que mantém uma linha de coerência, não se curvou aos modismos comerciais e vem desde o início de sua carreira nos brindando com a mpb do mais alto nível. Em sua trajetória, sempre defendeu as tradições monlevadenses, o centro histórico onde vive, o bloco carnavalesco Sapeca Iaiá, a música brasileira original e principalmente o samba. Rômulo é polêmico, tem opiniões fortes e não tem medo do debate. No limiar de comemorar 30 anos de carreira, pretende lançar um novo cd e invadir os espaços culturais com a sua música abençoada. Ele estará presente amanhã, no 5ª Cult, quando interpretará uma das suas especialidades que é o samba. 

Mas vamos à entrevista:


1)-  Quando foi que você percebeu que seu negócio é a música?

Embora já tivesse manifestado minha veia artística ainda criança, foi em 1979, quando me transferi para Belo Horizonte, almejando ingressar no exército. Nessa época tive contato com amigos de república e então começamos a tocar samba.

2)-  Você é de uma família extremamente musical. Conte-nos até que ponto essa família está na sua música.

Ainda na infância participei de programas de Calouros na Rádio Cultura de Monlevade, onde minha mãe e minhas tias se apresentavam com frequência. Acho que começou tudo por ai. Ao contrario do que acontece hoje, nesse tempo a música mais difundida era a musica de qualidade e foi minha família que me apresentou essa música, que me acompanha até hoje.

3) - E sua relação com o bairro industrial? Essa ambiência também influenciou na sua música?

No Centro Industrial, que eu prefiro chamar de Centro Histórico, pelo fato de concentrar a história e a cultura de João Monlevade, vários clubes de recreação e lazer, acabou sendo inevitável ser ‘contaminado’ pela arte da época, tão presente até hoje por lá.

4) - Você chegou a lançar um CD. Porque parou com os trabalhos autorais?

Continuo compondo, como tenho feito desde 1981, é uma busca diária. A dificuldade de lançar outro CD, devido a qualidade e a seriedade empregada no primeiro, é que me obrigou a esperar tanto tempo. Também pelo fato de o primeiro CD ter recebido as vantagens da Lei Federal de Incentivo à Cultura, fica difícil produzir algo na mesma qualidade. Mas agora, 10 anos depois, estou preparando um novo trabalho, em comemoração aos meus 30 anos de carreira.

5) - E os Afilhados do Sereno? Considero um dos melhores nomes de grupos que conheço. O trabalho com o grupo é baseado no chorinho, no samba, em ambos. Os Afilhados continuam existindo ou pararam? 

Enquanto houver sereno, seremos os afilhados. Me orgulho de ter encontrado esse nome e oferecido ao grupo. Nós, antes de integrantes, somos amigos e a música que fazemos é só um detalhe. Nos encontramos raramente para tocar, mas frequentemente para manter nossa amizade de 30 anos.


6) - E sobre o Sapeca Iaiá? Trata-se de um dos blocos mais famosos de João Monlevade, tão tradicional que sai mesmo que não haja carnaval oficial na cidade. Aliás, o Sapeca deflagra o seu carnaval oficial não é mesmo? Uma espécie de resistência da alma carnavalesca da cidade.

Passo os dias como um guardião da liberdade que merece um bloco caricato. Radicalmente, não admitimos nenhuma imposição como horário, figurino e percurso; sempre priorizamos a liberdade de cada folião, com isso sobrevivemos todo esse tempo tornando uma tradição. O Sapeca Iaiá, é o lugar ideal pra quem quer brincar o carnaval com alegria e respeito ao próximo.

7) - Há anos que vejo seus shows, seja nos festivais de música ou outros eventos. Você consegue conduzir muito bem a multidão, munido apenas do seu violão. Se tem um pandeiro então, vira baile. Mas sempre achei que a coisa ferve mesmo quando você toca samba. Qual a sua relação com o samba?

Apesar de ser amplo meu gosto musical, tenho pelo samba um carinho especial. A sutileza e até inocência das letras e melodias me remetem a minha emoção maior. Considero Paulinho da Viola e suas belas canções e poesias uma espécie de Deus do Samba.

8) - Existem projetos de novos discos do Rômulo Rás? Existe um projeto de fazer um Cd só de sambas, pra dar vazão a essa vocação nata?

Prometi a mim que um dia colocaria em pratica todo meu projeto musical. Como componho todos os estilos e ritmos, pretendo, inicialmente, produzir um CD com musicas próprias e convidar todos os artistas de nossa cidade a participar. Depois pretendo especificar os ritmos e consecutivamente escolher estilos. O CD de samba deve ser um dos primeiros.

9) - O que você teve oportunidade de aprender na convivência com a grande dama da música monlevadense, a eterna Neide Roberto?

Aprendi ou percebi que um artista deve se sujeitar mais, pedir mais ajuda, cobrar mais das autoridades, ou fazer mais por si mesmo. Testemunhei a esperança constante da minha tia Neide Roberto, e ao término vi sua frustração e desilusão. Já sei que se calar e esperar que façam por você é um erro. Hoje não espero nada que não seja realizado por mim mesmo. Neide é um grande exemplo de que só ter talento não basta.

10) - Pode adiantar alguma pérolas que o pessoal ouvirá na apresentação do 5ª Cult?

Primeiramente gostaria de agradecer a iniciativa da casa de cultura em me reconhecer como sambista e incluir-me nesse projeto, junto com o grupo Samba na Sola. Para mim é um privilégio. Como o objetivo é levar o samba de raiz ao grande público e nesta ocasião divulgar seu nascimento e história, pretendo apresentar sambas de compositores mineiros, como Ataulfo Alves, Geraldo Pereira, João Bosco, Ari Barroso e dando uma pincelada em compositores paulistas. Já que o samba nasceu na Bahia e hoje tem como altar o Rio de Janeiro, naturalmente passou por Minas e esbarrou em São Paulo.

11) - Você pode ser considerado um artista vencedor, que se sustenta na música há muitos anos. O que deixaria de mensagem para os artistas que estão começando?

Tenho matado de dois a três leões por dia para me manter. É difícil resistir à concorrência desleal. Meu trabalho é acústico e muitos buscam recurso nos aparatos eletrônicos, mas me resta esperança que o original continue tendo seu valor. Penso que se para ir a lua, o ponto de partida é a NASA e se para ir ao fundo do mar o Titanic; para o artista de musica o caminho é o Rio de Janeiro, ou no mínimo São Paulo. É muito difícil obter sucesso onde o sucesso não está.

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